quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Da Possibilidade de Cumulação dos Adicionais de Insalubridade e de Periculosidade



De muito se tem que a cumulação entre os adicionais de insalubridade e periculosidade em nosso ordenamento jurídico não se mostra possível, face a interpretação literal do texto do artigo 193, § 2º da CLT.

Ocorre que tal interpretação sempre se mostrou para mim um contrassenso ao passo que todo o ordenamento juslaboral, inclusive de fundo constitucional, buscou as melhorias das condições do exercício do trabalho, inclusive procurando extirpar as condições insalubres e perigosas, sendo os adicionais ora sob comento não uma forma de aumentar a remuneração do empregado, mas sim uma forma de também penalizar o empregador através da pecúnia afim de que o mesmo pudesse empreender esforços para diminuir ou até mesmo fazer cessar as condições mais gravosas na prestação do labor.

Ao entender que a cumulação não seria possível, mesmo quando distintos os agentes causadores, ou processualmente falando, quando díspares as causas de pedir, feria profundamente o princípio da isonomia, posto que aquele que estivesse diante de uma exposição a dois agentes distintos sendo um perigoso e outro insalubre, teria que optar por um dos adicionais, enquanto outro que fosse exposto a apenas um agente que fosse ao mesmo tempo insalubre e perigoso, também optaria, ou seja, aquele que efetivamente sofreria mais, receberia tratamento idêntico aquele que sofresse menos.

É dever do empregador, nos termos do artigo 7º, XXII, reduzir os agentes nocivos do meio ambiente de trabalho, não nos esqueçamos.

Assim, não nos parecia, como ainda não nos parece, isonômico o tratamento igualitário dispensado aqueles que se mostram claramente desiguais.

Nessa esteira de pensamento foi com muita satisfação que vi a decisão proferida no TST-E-ARR-1081-60.2012.5.03.0064 em que o TST de maneira muito clara e precisa analisou a questão, fazendo até mesmo uma mea culpa face a outrora tacanha interpretação literal conferida ao § 2º do artigo 193 Consolidado.

Utilizando o método teleológico e sistemático, a SDI1, promoveu uma mudança de paradigma que deverá dar o tom das demais decisões sobre o tema em todo o Brasil. Segundo os Ministros o referido dispositivo que veda a cumulação não seria incompatível com as normas internas e internacionais que visam a melhoria do meio ambiente laboral, porém, interpretação no sentido de que a opção é a única saída para o trabalhador que está submetido a condição insalubre e perigosa não se coaduna com todo o sistema protetivo que permeia o Direito Laboral.

Para os Ministros deverá o aplicador da norma verificar no caso concreto se estamos diante de uma ou duas causas de pedir, ou seja, se o empregado está submetido ou exposto a duas situações distintas, sendo uma perigosa e outra insalubre. Nesse caso, entendeu a Subseção, o empregado não estaria obrigado a optar por um dos adicionai, mas, pelo contrário, teria direito a percepção de ambos.

Diferente a situação daquele empregado que se encontra exposto a uma única situação que ao mesmo tempo se caracteriza como insalubre e perigosa. Neste caso, aplicável a antiga interpretação literal, devendo o empregado optar por um dos dois adicionais.

Assim, nos parece que andou muito bem o TST, ao acenar com essa mudança de paradigma, devendo todos nós que militamos na área trabalhista atentar para tal alteração e buscar a proteção dos trabalhadores de maneira mais assente com os princípios nacionais e internacionais que regulam a matéria.

terça-feira, 4 de outubro de 2016

Diferença entre o julgamento por equidade e o julgamento com equidade.

Dica rápida.

Normalmente utilizamos certas expressões no direito como se sinônimas fossem, mas na verdade tratam-se de institutos distintos trazendo distintas consequências jurídicas.

Hoje trago para vocês a diferença entre julgamento por equidade e julgamento com equidade.

Equidade é no sentido grego da palavra aquele ideal de justiça que deve nortear o julgador no momento de apreciar uma demanda que lhe fosse colocada para análise e decisão.

O julgamento por equidade viria a ser o desprezo ao ordenamento jurídico por parte do julgador com a aplicação no caso concreto do seu ideal individual e subjetivo de justiça, independentemente dos preceitos legais aplicáveis. Observe-se que inexiste qualquer tipo de lacuna, existindo sim apenas uma não concordância do aplicador do Direito com aquilo que foi pensado pelo Legislador.

Em nosso ordenamento jurídico o julgamento por equidade é exceção e só pode ser utilizado quando autorizado por Lei.

Já o julgamento com equidade é dever de todo e qualquer juiz que tentará na aplicação da norma, assim entendidos princípios e regras, obter a melhor solução para fins de pacificação social que, em última análise e instância, é o ideal de justiça.

O julgamento com equidade é ideal que deve ser buscado por todo aquele que milita na área jurídica, seja na função de Magistrado, seja na de Promotor, Advogado e parte, por que não.


Não adianta pensarmos que o Novo Código de Processo Civil com as suas normas de cooperação terá o condão de a tudo resolver, se não partir de todos os envolvidos o querer cooperar para que possamos obter uma solução justa e equânime da lide.

A teoria das nulidades no Direito do Trabalho

Estudando sobre a teoria das nulidades no âmbito trabalhista, me deparei com as situações previstas como capazes de gerar a nulidade do negócio jurídico – contrato de trabalho – e suas consequências para o trabalhador.

Antes de mais nada se faz necessário desenvolver uma análise sobre a própria validade do negócio jurídico, para assim podermos de maneira muito mais simples, entender e estudar as invalidades dos negócios jurídicos.

Assim, temos que o negócio jurídico deverá ser analisado sob os planos da existência, validade e eficácia, como já preconizado pelo saudoso Pontes de Miranda em disciplinamento denominado pela doutrina de Escada Ponteana.

Nessa escada, ensinava o grande civilista que o negócio jurídico deverá percorrer um caminho para que possa, ao final, produzir todos os efeitos típicos dele esperados. Melhor dizendo, para que o negócio seja eficaz, deverá existir e ser válido e para que seja válido, deve existir, sendo um precedente lógico do outro.

Para saber se um negócio existe devemos verificar os seus elementos essenciais ou estruturais, quais sejam, agente, objeto e forma, ou seja, para a existência do negócio jurídico não se exige qualquer adjetivação.

Note-se que o Código Civil não se preocupa com o plano de existência em seu artigo 104, partindo, de pronto, para o plano da validade. Assim, para que o negócio jurídico seja considerado válido faz-se necessária a adjetivação dos elementos estruturais, devendo o agente ser capaz, o objeto ser lícito e a forma ser prescrita ou não defesa em lei.

No que concerne ao plano da eficácia, diz respeito aos efeitos práticos que o negócio jurídico existente e válido são capazes de produzir concretamente.

Assim, caso o negócio jurídico se mostre inválido, estaremos diante de uma irregularidade que, a depender da gravidade da ofensa ao ordenamento jurídico, gerará nulidade ou anulabilidade do ato praticado.

Havendo lesão a norma de ordem pública estaremos diante de nulidade com todas as suas características e consequências já por demais conhecidas. Sendo lesada norma de ordem privada estaremos diante de anulabilidade.

Na nulidade temos a inexistência de efeitos e a retroatividade da declaração, devendo as partes retornar ao status quo ante. Na anulabilidade os efeitos já ocorridos permanecerão e a declaração judicial não retroagirá, produzido esta efeitos ex nunc.

Essa é a regra geral no âmbito do Direito Civil que sofre adaptações quanto a sua aplicabilidade no Direito do Trabalho por uma questão muito simples: a força de trabalho, a energia dispendida pelo trabalhador não pode a ele ser devolvida, ou seja, as partes não podem retornar ao estado anterior de coisas e assim, em algumas situações, teremos os efeitos mesmo diante de um contrato nulo.

Isso se mostra por demais importante quando analisamos as hipóteses de trabalho proibido e ilícito, ligado ao elemento essencial objeto. No contrato do trabalho o objeto é a prestação de trabalho mediante remuneração, por pessoa física, com subordinação jurídica, pessoalidade e de forma habitual.

Tal trabalho deverá, por óbvio, ser desempenhado de maneira lícita, assim entendida tanto aquela não vedada pelo ordenamento jurídico, como aquela que não se constitua em ilícito penal.

O trabalho que venha a ser vedado pelo ordenamento jurídico é denominado trabalho proibido, como no caso do trabalho noturno prestado pelo menor.

A Constituição Federal proíbe esse tipo de trabalho para o menor, prevendo a nulidade de pleno direito do contrato que assim prever e da execução assim prestada. O problema é que uma norma protetiva não pode ser invocada para prejudicar o trabalhador. A norma foi criada para proteger o menor e não poderia ser invocada pelo empregador para, por exemplo, não pagar o adicional noturno face a proibição legal.

Assim, temos que no caso de prestação de trabalho proibido, apesar da nulidade do contrato de trabalho, teremos a validade dos seus efeitos, ou seja, o trabalhador teria direito a receber todas as verbas trabalhistas que fossem devidas caso o contrato não tivesse sido nulo.

O problema maior diz respeito a questão da prestação ilícita do trabalho e para tentar melhor elucidar o tema será necessário buscar o saber do grande jurista baiano José Rodrigues Pinto que diferencia o objeto do contrato do trabalho em imediato e mediato.

Para ele o objeto imediato do contrato do trabalho é a própria prestação do trabalho, ou o trabalho desempenhado propriamente dito. Já o objeto mediato seria a utilização desse trabalho pelo empregador.

Com tais informações passemos a analisar algumas situações.

Imagine uma loja que venda produtos oriundos de descaminho com emissão de notas falsas. Os vendedores não têm conhecimento sobre a origem dos produtos ou sobre a fraude na emissão de notas. Nesse caso estaríamos diante de um contrato nulo sem a produção de qualquer efeito?

Vejamos. O objeto imediato no caso apresentado é a venda de produtos, o que não é atividade ilícita. Já o objeto mediato é ilícito. Ora, estando os vendedores de boa-fé, não conhecendo da origem da prática delituosa, imperioso o reconhecimento dos efeitos daquele contrato de trabalho, posto que o objeto imediato não seria ilícito e, portanto, seria válido.

Em sentido diametralmente oposto temos, por exemplo, o apontador do jogo do bicho. Tanto o objeto imediato como o mediato são ilícitos e o empregado tem conhecimento sobre tal situação, ou seja, não pode alegar a boa-fé. Nesse caso não haveria qualquer tipo de efeito decorrente de tal prestação de serviço. É o entendimento encontrado na OJ-SDI1 199 do TST.

OJ-SDI1-199 JOGO DO BICHO. CONTRATO DE TRABALHO. NULIDADE. OBJETO ILÍCITO (título alterado e inserido dispositivo) - DEJT divulgado em 16, 17 e 18.11.2010 É nulo o contrato de trabalho celebrado para o desempenho de atividade inerente à prática do jogo do bicho, ante a ilicitude de seu objeto, o que subtrai o requisito de validade para a formação do ato jurídico.


Assim podemos concluir que no âmbito do Direito do Trabalho a teoria das nulidades deve ser analisado com maior cuidado, tendo em vista a peculiaridade consistente na impossibilidade de devolução da força de trabalho do empregado, o que gera, a depender da situação, efeitos mesmo em contratos de trabalho nulos.