Estudando sobre a teoria das
nulidades no âmbito trabalhista, me deparei com as situações previstas como
capazes de gerar a nulidade do negócio jurídico – contrato de trabalho – e suas
consequências para o trabalhador.
Antes de mais nada se faz
necessário desenvolver uma análise sobre a própria validade do negócio
jurídico, para assim podermos de maneira muito mais simples, entender e estudar
as invalidades dos negócios jurídicos.
Assim, temos que o negócio
jurídico deverá ser analisado sob os planos da existência, validade e eficácia,
como já preconizado pelo saudoso Pontes de Miranda em disciplinamento
denominado pela doutrina de Escada Ponteana.
Nessa escada, ensinava o grande
civilista que o negócio jurídico deverá percorrer um caminho para que possa, ao
final, produzir todos os efeitos típicos dele esperados. Melhor dizendo, para
que o negócio seja eficaz, deverá existir e ser válido e para que seja válido,
deve existir, sendo um precedente lógico do outro.
Para saber se um negócio existe devemos
verificar os seus elementos essenciais ou estruturais, quais sejam, agente,
objeto e forma, ou seja, para a existência do negócio jurídico não se exige
qualquer adjetivação.
Note-se que o Código Civil não se
preocupa com o plano de existência em seu artigo 104, partindo, de pronto, para
o plano da validade. Assim, para que o negócio jurídico seja considerado válido
faz-se necessária a adjetivação dos elementos estruturais, devendo o agente ser
capaz, o objeto ser lícito e a forma ser prescrita ou não defesa em lei.
No que concerne ao plano da
eficácia, diz respeito aos efeitos práticos que o negócio jurídico existente e
válido são capazes de produzir concretamente.
Assim, caso o negócio jurídico se
mostre inválido, estaremos diante de uma irregularidade que, a depender da
gravidade da ofensa ao ordenamento jurídico, gerará nulidade ou anulabilidade
do ato praticado.
Havendo lesão a norma de ordem
pública estaremos diante de nulidade com todas as suas características e consequências
já por demais conhecidas. Sendo lesada norma de ordem privada estaremos diante
de anulabilidade.
Na nulidade temos a inexistência
de efeitos e a retroatividade da declaração, devendo as partes retornar ao
status quo ante. Na anulabilidade os efeitos já ocorridos permanecerão e a
declaração judicial não retroagirá, produzido esta efeitos ex nunc.
Essa é a regra geral no âmbito do
Direito Civil que sofre adaptações quanto a sua aplicabilidade no Direito do
Trabalho por uma questão muito simples: a força de trabalho, a energia
dispendida pelo trabalhador não pode a ele ser devolvida, ou seja, as partes
não podem retornar ao estado anterior de coisas e assim, em algumas situações, teremos
os efeitos mesmo diante de um contrato nulo.
Isso se mostra por demais
importante quando analisamos as hipóteses de trabalho proibido e ilícito,
ligado ao elemento essencial objeto. No contrato do trabalho o objeto é a
prestação de trabalho mediante remuneração, por pessoa física, com subordinação
jurídica, pessoalidade e de forma habitual.
Tal trabalho deverá, por óbvio,
ser desempenhado de maneira lícita, assim entendida tanto aquela não vedada
pelo ordenamento jurídico, como aquela que não se constitua em ilícito penal.
O trabalho que venha a ser vedado
pelo ordenamento jurídico é denominado trabalho proibido, como no caso do
trabalho noturno prestado pelo menor.
A Constituição Federal proíbe esse
tipo de trabalho para o menor, prevendo a nulidade de pleno direito do contrato
que assim prever e da execução assim prestada. O problema é que uma norma protetiva
não pode ser invocada para prejudicar o trabalhador. A norma foi criada para
proteger o menor e não poderia ser invocada pelo empregador para, por exemplo, não
pagar o adicional noturno face a proibição legal.
Assim, temos que no caso de prestação
de trabalho proibido, apesar da nulidade do contrato de trabalho, teremos a
validade dos seus efeitos, ou seja, o trabalhador teria direito a receber todas
as verbas trabalhistas que fossem devidas caso o contrato não tivesse sido
nulo.
O problema maior diz respeito a
questão da prestação ilícita do trabalho e para tentar melhor elucidar o tema
será necessário buscar o saber do grande jurista baiano José Rodrigues Pinto
que diferencia o objeto do contrato do trabalho em imediato e mediato.
Para ele o objeto imediato do
contrato do trabalho é a própria prestação do trabalho, ou o trabalho desempenhado
propriamente dito. Já o objeto mediato seria a utilização desse trabalho pelo
empregador.
Com tais informações passemos a
analisar algumas situações.
Imagine uma loja que venda
produtos oriundos de descaminho com emissão de notas falsas. Os vendedores não têm
conhecimento sobre a origem dos produtos ou sobre a fraude na emissão de notas.
Nesse caso estaríamos diante de um contrato nulo sem a produção de qualquer
efeito?
Vejamos. O objeto imediato no
caso apresentado é a venda de produtos, o que não é atividade ilícita. Já o
objeto mediato é ilícito. Ora, estando os vendedores de boa-fé, não conhecendo
da origem da prática delituosa, imperioso o reconhecimento dos efeitos daquele
contrato de trabalho, posto que o objeto imediato não seria ilícito e,
portanto, seria válido.
Em sentido diametralmente oposto
temos, por exemplo, o apontador do jogo do bicho. Tanto o objeto imediato como
o mediato são ilícitos e o empregado tem conhecimento sobre tal situação, ou
seja, não pode alegar a boa-fé. Nesse caso não haveria qualquer tipo de efeito
decorrente de tal prestação de serviço. É o entendimento encontrado na OJ-SDI1 199
do TST.
OJ-SDI1-199 JOGO DO BICHO.
CONTRATO DE TRABALHO. NULIDADE. OBJETO ILÍCITO (título alterado e inserido
dispositivo) - DEJT divulgado em 16, 17 e 18.11.2010 É nulo o contrato de
trabalho celebrado para o desempenho de atividade inerente à prática do jogo do
bicho, ante a ilicitude de seu objeto, o que subtrai o requisito de validade
para a formação do ato jurídico.
Assim podemos concluir que no âmbito
do Direito do Trabalho a teoria das nulidades deve ser analisado com maior
cuidado, tendo em vista a peculiaridade consistente na impossibilidade de
devolução da força de trabalho do empregado, o que gera, a depender da
situação, efeitos mesmo em contratos de trabalho nulos.
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